No dia 26/10/2022 os Ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiram por unanimidade que não cabe a aplicação do CDC-Código de Defesa do Consumidor nos contratos de compra e venda de imóvel com pacto de Alienação Fiduciária. A decisão tem caráter repetitivo e pode ser replicada aos demais processos de mesma natureza.

Venceu a lógica muitas vezes aplicadas em instâncias inferiores:

LEX SPECIALIS DEROGAT LEGI GENERALI” é regra conhecida do direito, e que aqui tem perfeita aplicação.

Entenda-se: tendo a lei especial (Lei 9.514/97) disciplinado integralmente a forma de liquidação dos débitos referentes a imóveis alienados fiduciariamente, não cabe falar em devolução das quantias pagas, restando inaplicável o artigo 53 da Lei consumerista (Lei nº 8.078/90).

Para melhor entendimento, abaixo a decisão publicada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em 2005.

O caso:

Adquirente de unidade imobiliária ajuizou ação para pleitear restituição de parte da quantia recebida em razão do contrato de compra e venda de imóvel, garantido pela alienação fiduciária do bem, rescindido.

Esclareceu ter havido a retomada do imóvel, já alienado em leilão público. Invocou a aplicação do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Citada, a ré contestou a ação:

Quanto ao mérito, argumentou não estar obrigada à devolução da quantia paga pelos autores, na medida em que inadmissível tal possibilidade diante da Lei nº 9.514/97, que disciplinou a contratação da alienação fiduciária do imóvel adquirido pelo devedor, cabendo, portanto, a devolução ao devedor apenas do saldo credor porventura apurado com o leilão do bem.

Em réplica, o autor rebateu os argumentos lançados na contestação.

Decisão:

O negócio jurídico foi realizado nos termos da Lei nº 9.514/97 que instituiu o Sistema de Financiamento Imobiliário e no seu artigo 22 “caput” criou a alienação fiduciária em garantia de imóvel, trata-se de direito real de garantia criado pelo artigo 17, IV, § 1º da citada lei.

Na hipótese de inadimplemento do contrato pelo adquirente que intimado a purgar a mora descumpre a obrigação, consolida-se a favor do fiduciário a propriedade do imóvel e este está autorizado pela lei, artigo 27 “caput”, a alienar o imóvel por meio de leilão público, realizado este e vendida a coisa, terá o adquirente direito ao recebimento de determinado valor se apurado montante superior àquele correspondente ao débito mais as despesas geradas pelo procedimento, na expressão da lei terá direito à quantia que sobejar.

Na hipótese deste saldo não existir, considera-se quitada a dívida, assim dispõe o citado dispositivo nos seus parágrafos 5º e 6º.

Observo não existir na cessão irregularidade alguma, pois foi realizada de conformidade com a Lei nº 9.514/97.

O inadimplemento do contrato pelo autor é fato incontroverso. Consolidou-se, então, a propriedade do imóvel a favor da cessionária indicada no processo, para que esta, por sua vez, leve o imóvel a leilão público e, por conseguinte, extinguir-se-á a dívida contraída pelo autor.

O procedimento adotado para a liquidação do contrato não atenta contra o Código de Defesa do Consumidor, LEI DE CARÁTER GERAL, que se aplica ao negócio jurídico realizado apenas naqueles aspectos não regulados pela lei nova e especial em tela.

Destarte, o regime jurídico específico estabelecido para a alienação fiduciária de coisa imóvel PREVALECE SOBRE as regras de natureza geral fixadas naquele, em virtude do que não se aplica o artigo 53 da Lei nº 8.078/90.

Posto isso, JULGO IMPROCEDENTE a ação ajuizada pelo adquirente.

Nota: grifos nossos para destacar pontos importantes.